sexta-feira, 1 de abril de 2016

A EMERGÊNCIA PRÉ-HOSPITALAR




O filho de um amigo meu foi acometido de doença súbita. O jovem de 18 anos, sem qualquer antecedente clínico relevante, sentiu-se mal ao início da manhã, antes mesmo de se levantar. Os pais estavam em casa. O Pai Bombeiro Voluntário desde sempre, imediatamente teve noção do que se estava a passar, ligou diretamente para os seus Bombeiros e iniciou o protocolo de suporte básico de vida. Não será a mesma coisa fazê-lo no seu próprio filho, como tantas outras vezes o terá feito em tantos cidadãos mais ou menos anónimos, mas, como Bombeiro, estava naturalmente preparado para tudo.
Pouco depois, chegavam os colegas Bombeiros munidos com o Desfibrilador Automático Externo (DAE), o equipamento que, até há pouco tempo, era de uso exclusivo dos médicos.
O conhecimento, a celeridade de atuação nas manobras de reanimação, a rapidez da comunicação ao meio de socorro mais próximo, o equipamento adequado e a eficácia na sua utilização fizeram a diferença entre a celebração da vida e a angústia da morte.
Não fora esta feliz sequência de procedimentos, e hoje poderíamos estar a lamentar a perda prematura de um jovem de 18 anos.
Este acontecimento, e o facto de estar a fazer o balanço de um dia em que os “meus” Bombeiros registaram três vitimas mortais em 13 situações de emergência na área da saúde, levaram-me a tornar pública a minha reflexão.
Nestas treze situações de que resultaram três mortes, numa delas, um homem de cerca de 50 anos, que reside a pouco mais de 200 metros do quartel, também foi utilizado o DAE e efetuadas todas as manobras de reanimação, só que porventura tarde demais. Neste caso, quem estava em casa não sabia, não teve discernimento ou simplesmente não percebeu a situação e não houve lugar a reanimação imediata. Neste caso, quem pediu socorro ligou o número 112, cuja chamada pode ser atendida no Porto, ou Lisboa ou em Coimbra, uma e duas vezes, respondeu a uma bateria de questões e esperou que a sua chamada fosse depois encaminhada para os Bombeiros que, na situação em apreço, ficam a 200 metros de distância. Tudo isto demora seguramente entre 10 a 15 minutos. Se adicionarmos o tempo de deslocação parece uma eternidade.
A questão não está no facto de ligar ou não para o 112, naturalmente que nem toda a gente sabe o número de telefone dos Bombeiros mais próximos, e as doenças súbitas e paragens cardiorrespiratórias não têm lugar nem horário pré-definidos. O número 112 constituiu um enorme avanço no socorro e na assistência em geral, ao nível europeu, mas não é, nem pode, ser único nem exclusivo.
O que importa salientar é que nem sempre temos obrigatoriamente que cumprir com tudo o que está determinado. Quando se trata de salvar a vida humana temos que agir com conhecimento e com celeridade, sem medo que um qualquer operador, por mais respeitável que seja, e que eu respeito muito, nos questione, tantas vezes com arrogância, porque ligou para ali quando devia ter ligado para aqui.
O que importa é que  todos os agentes e operadores na área da saúde, da proteção e do socorro, possam pautar a sua atuação pelo respeito mútuo e pela indispensável confiança, que deve prevalecer entre todos os que concorrem para os mesmos fins, sem preconceitos ou esboço de “capelinhas”, colocando a salvaguarda da vida acima de todo e qualquer corporativismo.
O que importa destacar, é a necessidade de ter os equipamentos adequados e os correspondentes conhecimentos, sem ter medo da perda de competências ou privilégios. A utilização do DAE, é um bom e recente exemplo, bem como a “guerra” e falta de acordo entre Enfermeiros e Técnicos de Emergência.
Por último, o que mais importa salientar é a necessidade cada vez maior de aprender gestos básicos e simples que podem salvar vidas.
Pela nossa parte, no que aos Bombeiros diz respeito, julgamos que temos feito o nosso caminho para mudar este paradigma do desconhecimento. Nas nossas “escolinhas”, nos Agrupamentos de Escolas, nas empresas, nas IPSSs, na sociedade em geral, no entanto, e perante um número crescente de emergências, temos também consciência que há ainda muito para fazer e mentalidades para mudar.