segunda-feira, 19 de maio de 2014

LEVARAM OS ANÉIS E DEIXARAM OS DEDOS PORQUE PRECISAM DELES


O discurso político é hoje tão estéril e incoerente que roça os limites da irracionalidade.
Talvez por isso já não haja paciência para ouvir tantos disparates, tantas promessas vazias, tantas frases sem sentido e repetidas até à exaustão, como se eles, os senhores dos microfones e dos holofotes não fossem, eles mesmo, os mesmos de sempre que nos fizeram também sempre acreditar nesta Europa forte e solidária, para a qual agora somos, mais uma vez, chamados a votar.
Não, não sou antieuropeu. Estou convicto, que para os países que atualmente integram a União Europeia, a estabilidade e a democracia em toda a Europa Central e Oriental trouxeram, em muitos aspetos, mais prosperidade, mais e melhores equipamentos, mais autoestradas, mais conhecimento, mais segurança. Pagámos, no entanto, um preço demasiado elevado. A falta de vontade política, a ausência de lideranças crediveis, as dificuldades nos processos de decisão e a supremacia do capital realtivamente à política, descredibilizaram o projeto europeu e mais do que isso, conseguiram esbulhar algumas das maiores riquezas dos cidadãos e aumentar as assimetrias, quando a génese do projeto era exatamente o contrário.
Lembro-me, e vem isto a propósito do meu pensamento de hoje, que talvez há cerca de cinco seis anos, quando se começou a falar de crise, abriram em cada esquina, em cada rua, em cada centro comercial, as lojas de compra de ouro em segunda mão. Letras apelativas propagavam a aquisição de objetos de valor e recordo-me mesmo de ver nas ruas mais movimentadas das cidades, homens com cartazes pendurados ao pescoço, chamando a atenção para a venda fácil de tudo quanto as pessoas e os seus antepassados tinham guardado ao longo de muitos anos e com tanto sacrifício.
Claro que eles, esses mesmos de sempre, sabiam que Portugal, esse Portugal profundo e pobre, era simultaneamente muito rico em ouro guardado e passado de geração em geração. Era preciso empobrecer ainda mais para obrigar a vender, de preferência ao desbarato, todo este valioso património.
Foi isso que alegadamente fizeram. Hoje, talvez porque já pouco resta, todas essas lojas fecharam. Fizeram o seu tabalho. Levaram-nos tudo, os valores, as jóias, os anéis.
Sim, levaram-nos os anéis e deixaram-nos os dedos, porque precisam deles para que possamos continuar a votar e a legitimar....os mesmos de sempre.